Crises econômicas só foram superadas após afastamentos de presidentes

Desde o governo João Goulart não vivemos no Brasil uma crise tão grave. É importante conhecer melhor os seus antecedentes, que culminaram com a queda de Jango em 31 de março de 1964, para analisarmos a renúncia de Collor em 29 de dezembro de 1992 e compararmos estas duas crises com a atual.

Jango assumiu o poder em 1961 por causa da renúncia do presidente eleito Jânio Quadros, pouco mais de seis meses depois de sua posse. À época, os militares não desejavam dar posse a Jango e pressionaram o Congresso para que votasse um regime parlamentarista como contrapartida. Em setembro de 1961, com Tancredo Neves como seu primeiro-ministro e o embaixador Walter Moreira Salles como ministro da Fazenda, Jango, enfim, foi empossado.

Fazia também parte do governo o economista cepalino Celso Furtado, que lançou o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, mas com forte preocupação em combater a inflação — que vinha numa trajetória de alta desde 1960, com 25,4%, tinha atingido 34,7% em 1961, e que permaneceu subindo, chegando a atingir 80% dois anos à frente.

San Tiago Dantas, um dos ministros da Fazenda do governo Jango, dizia: “Em primeiro lugar, o país não comporta mais uma administração sem rigoroso planejamento. Se queremos lutar contra a inflação, a primeira medida é um balanço dos recursos de que dispomos e uma orçamentação honesta das nossas disponibilidades”. O PIB, que havia crescido 9,4% em 1960, último ano do governo JK, caiu sucessivamente para 8,6% e 6,6%, fechando 1963 com 0,6%.

Com o agravamento da crise econômica e uma guinada política do presidente Jango, que já não contava com apoio no Congresso, o povo foi para as ruas mostrar solidariedade ao presidente, realizando, em março de 1964, na Central do Brasil, uma grande e histórica demonstração popular. Foi imediata a reação dos que discordavam do presidente, e realizaram-se, Brasil afora, manifestações contrárias, como A Marcha da Família com Deus e pela Liberdade.

Em 31 de março de 1964, as Forças Armadas depuseram João Goulart.

Fernando Collor foi o primeiro presidente eleito por voto direto após a redemocratização. Seu primeiro ano de governo foi o maior desastre econômico do último meio século, com o PIB apresentando queda de 4,3% em 1990 e um descontentamento geral da população com o sequestro da poupança naquele mesmo ano.

A ausência de uma base parlamentar que lhe desse apoio associada à não recuperação da economia em 1991 e 1992, que se encerrou com uma queda do PIB de 0,5%, inviabilizou uma reação do presidente Collor quando surgiram as primeiras acusações de corrupção em seu governo — todas elas envolvendo o seu amigo PC Farias. Outra acusação de corrupção, desta vez por meio de uma entrevista de seu irmão, Pedro Collor de Mello, à revista “Veja”, em abril de 1992, representou o começo de um processo de impeachment no Congresso.

Collor chamou o povo às ruas para apoiá-lo e foi contrariado, resultando no seu afastamento e na posse de seu vice-presidente, Itamar Franco. Jango, deposto pelos militares, e Collor, pelo Congresso, tiveram como antecedentes crises econômicas que só foram superadas após seus afastamentos.

O segundo governo da presidente Dilma Rousseff enfrenta seguramente a pior crise econômica das últimas décadas. A (re)eleição, por pequena margem, e adoção de medidas econômicas contrárias a tudo que foi prometido no período eleitoral fizeram com que a presidente, em poucos meses, experimentasse uma queda de popularidade sem precedentes.

O Congresso, que deu sustentação política ao seu primeiro governo, passou a votar contra os ajustes propostos por seu novo ministro da Fazenda, reduzindo os efeitos esperados do ajuste fiscal anunciado. Iniciada por um pífio desempenho econômico no ano passado, com PIB 0,1% negativo e projeções de queda se aproximando dos 3% em 2015, a crise tem agravado ainda mais o cenário político.

O prosseguimento da crise econômica — com aumento do desequilíbrio fiscal, agravamento do desemprego e perspectivas negativas para a economia em 2016, além do risco iminente de perda do grau de investimento — são indicadores a serem observados com redobrada atenção. Acrescentem-se ao já suficientemente dramático cenário econômico as perspectivas nada otimistas em relação às reformas administrativa, previdenciária e tributária e os desdobramentos da Operação Lava-Jato, envolvendo, entre outros, o próprio partido da presidente. O quadro e o momento são pouco inspiradores.

Como dizia o falecido Ulysses Guimarães, “a voz das praças é mais forte que a voz das urnas”. Eu acrescento: o futuro (do Brasil) a Deus pertence. Mas a responsabilidade é nossa.