A teoria psicocibernética desenvolvida nos Estados Unidos há algumas décadas nada mais é do que a teoria de administração de ansiedades. Foi desenvolvida por um cirurgião plástico, no final dos anos 60, para auxiliar seus clientes na administração das ansiedades decorrentes desse tipo de cirurgia. A sociedade brasileira é hoje vítima da ansiedade da reforma da Previdência. Retomou-se recentemente o debate entre o regime de capitalização e o regime de repartição.
O nosso regime de repartição, de responsabilidade exclusiva de pagamentos dos benefícios pelo governo, é extremamente generoso para os participantes. Enquanto as condições demográficas permitiram, não houve preocupação em mudá-lo, principalmente com o estabelecimento de uma idade mínima para aposentadoria. Algumas tentativas foram feitas, mas sem sucesso. A criação do fator previdenciário, no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), para corrigir injustiças sociais que permitiam aos mais ricos ou com trabalho formalizado, como aos sindicalistas, se aposentarem por tempo de contribuição aos 50 anos enquanto os mais pobres, que não tinham como comprovar tempo de contribuição, só se aposentavam por idade aos 65 anos numa clara distribuição perversa de renda.
Quando presidi a CVM em 1994, criei um grupo de trabalho para propor uma reforma da Previdência em regime de capitalização e recebi um telefonema do secretário executivo do Ministério da Fazenda me questionando: o que a CVM tem a ver com Previdência? Respondi objetivamente: “sem poupança privada não há mercado de capitais”, com concordância imediata do secretário.
Convidei para compor o grupo centros de pesquisa, como a Fipe, o Ibmec e o Instituto Atlântico, consultoria de técnicos do Ipea, e a participação do ministério da Previdência para propor um modelo misto de repartição e capitalização corrigindo os exageros paternalistas, com estabelecimento de idade mínima para todos. O pilar de capitalização entendíamos ser fundamental para a constituição de uma poupança privada de longo prazo, que garantisse recursos para os investimentos, também de longo prazo, em infraestrutura logística e social. Infelizmente, na transição do governo Itamar para o de FHC, o medo dos custos de transição de um modelo para o outro impediram seu encaminhamento.
De lá para cá, a situação da Previdência piorou e há quase um consenso sobre a necessidade de uma reforma. Além da proposta apresentada pelo governo Temer, que se encontra no Congresso, há várias outras sendo apresentadas ao novo governo. A Fipe, que contratei em 1979, quando assessorava a presidência da Bovespa, para preparar uma proposta em regime de capitalização, que eu havia visto ser implantado nos Estados Unidos em 1974 e que resultou na “nova economia americana” das décadas de 1980 e 1990, fruto da poupança previdenciária americana que saiu de 30% do PIB, em 1970, para 115% em 2000,permitindo o acesso ao mercado de capitais de mais de 35.000 startups, pequenas e médias empresas com enorme impacto no crescimento econômico americano.
A Fipe encaminhou, com apoio da Abrapp e da Fenaprevi, ao governo Bolsonaro a proposta Uma Nova Previdência para os Novos Trabalhadores, igual para todos os brasileiros, num regime misto de três pilares. Um não contributivo, de R$ 550, de renda básica para o idoso; outro contributivo, em regime repartição, até R$ 1.650 que garantirá a 75% dos contribuintes uma reposição de 100% de seu salário na ativa, criando-se para os mais pobres um modelo socialmente mais justo; e um terceiro pilar de capitalização, a partir de R$ 2.200 até o teto, que além de reduzir a responsabilidade do governo com o pagamento desses benefícios, será importante instrumento de formação de poupança privada de longo prazo para a retomada dos investimentos no Brasil.
Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense em 18/01/2019 – Download do artigo original em PDF
Por THOMÁS TOSTA DE SÁ
Presidente do Comitê para o Desenvolvimento do Mercado de Capitais (Codemec) e ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários